
Rir na guerra é vilanice
Política brasileira é maquiavélica e não demonstra nenhuma preocupação com o próprio cenário e suas consequências para com a nação
Arnaldo V. Carvalho*
Semanas antes da Câmara dos Deputados votar o impeachment, especuladores do mercado financeiro já comemoravam, e consultores aqui e lá lançavam aos leigos fórmulas de “como lucrar com queda de Dilma”, ou “fature com a crise”. A maioria não chega a perceber que tal comportamento faz parte de uma crise ética a qual nossa cultura padece mais a cada dia. Que dirá de Michel Temer, que representou muita gente ao se permitir ser filmado rindo [não] a toa, em sua própria casa, a assistir a derrota de sua adversária (até onde entendo, parceira dos últimos sete anos – da decisão por unirem-se e concorrerem juntos ao momento em que deixou de interessar). Infelizmente, tal gesto representa a alegria de muita gente, de novo pela assombrosa mentalidade que euforiza na destruição do Outro.
O fim – a vitória – não justifica o meio – o riso. As vitórias alcançadas por Temer e seu grupo são vitórias de uma guerra, uma guerra política. E não há motivo para risos quando se trata de guerra. Nela, mesmo os vencedores perderam.
Incrível que uma guerra política travada no território brasileiro encontre paralelos esdrúxulos para com a guerra do Golfo. O ditador Iraquiano um dia apoiado pelo EUA, tornava-se monstro. O motivo alegado: terrorismo, armamento nuclear; O motivo real: a guerra pelo Petróleo. Civis mortos por todos os lados na caça ao assassino. Museus, monumentos, escolas e universidades, escolas e instituições diversas arrasadas, O espólio de guerra que se arrasta por todos esses anos e leva o país a uma situação miserável como não se viu antes. E ninguém fala nada, “fez-se o certo”. Vejam se não é o que está acontecendo, Lula>Dilma, herois>monstros. Motivo: “afundou” (ela) o país. Motivo oculto: especulação financeira e Petróleo (altamente relacionado a crise da Petrobrás). Consequencia: sucateamento da saúde, educação, miséria geral.
O custo social da batalha travada entre os diversos atores políticos no Brasil é incalculável. A angústia do povo, o descrédito da nação, os direitos humanos ameaçados, a desestruturação das instituições, tudo isso é parte do ônus de uma guerra política. Se terminasse hoje, levaríamos décadas para refazer o que foi abaixo. E está longe de terminar.
O Brasil é o campo de guerra e seu verdadeiro perdedor. Suas pessoas estão divididas em trincheiras que defendem esse ou aquele grupo, e isso nos mantém em um estado de enfraquecimento permanente. Dividir para conquistar, já dizia Julio César**.
É claro que você pode ficar satisfeit@ com a saída da Dilma. É um direito seu! Pode encher-se de uma esperança baseada em argumentos diversos. Mas divertir-se? Deleitar-se? Para mim, a emissão daquele sorriso Temer-oso? , e o regozijo do mercado e de tanta gente… É, na verdade, vergonhoso (e muito irresponsável). Tenho e terei vergonha de fazer parte de um país que se presta a esse tipo de atitude.
Não há graça no motivo que afasta Pezão do governo do Estado do Rio de Janeiro, não há graça no processo de afastamento de Dilma Roussef, não houve graça na caça ou no enforcamento de Sadam Hussein. Não haverá qualquer graça em comemorar derrota alguma, doença alguma, morte alguma. A derrota do Outro é a derrota da sociedade, é a nossa derrota. No caso particular do Brasil, piora sabermos que derrotas políticas que tenham acontecido ou venham acontecer no tempo presente não foi ou será uma vitória da transparência sobre a indecência.
***
* Arnaldo V. Carvalho é pai, terapeuta, pedagogo e cidadão participativo.
** Célebre frase escrita há mais de dois mil anos pelo Imperador romano Julio César. Você sabe em que contexto ele emitiu essa frase? Julio César foi um dos primeiros estadistas a criar um ampo espectro de espionagem no mundo ocidental. Famoso pela conquista das Gálias Celtas (praticamente toda a europa ocidental), Julio César muito antes de efetuar qualquer invasão estudava o povo “Keltoi” (celta, ou “estrangeiro”, em grego), e enviava emissários com a missão de semear discórdia entre os clãs dessas regiões. Ao dividir os clãs, ele os enfraquecia, e a conquista tornava-se fácil. É famosa a ocasião em que, próximo a região da atual França, César precisou de cerca de 40 mil homens para derrotar 250 mil guerreiros celtas, fragmentados por suas disputas internas.
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