Jejum

 

A redescoberta do jejum

Jejum e bem-estar parecem ser conceitos completamente antagônicos nos dias de hoje. Se comer passou a ser muito mais uma forma de aliviar as tristezas e ansiedades, fechar a boca para todas as delícias que a indústria alimentícia nos oferece é visto como um sacrifício supremo. Mas, na contra-mão dessa idéias, algumas pessoas começam a descobrir agora que o jejum, se bem utilizado, é uma excelente terapia para viver com mais saúde.

O naturopata e terapeuta corporal Arnaldo V. Carvalho é um dos que recomendam – e praticam – essa milenar forma de tratamento e limpeza orgânica. Por um dia a cada mês, Arnaldo alimenta-se apenas com água ou suco de frutas e garante que a prática pode oferecer muitos benefícios: o jejum limpa as mucosas intestinais, elimina metais tóxicos e oxigena o organismo. “Jejuar pode ajudar ainda a combater doenças infecciosas, diminuir a pressão arterial e melhorar a acuidade mental”, diz Arnaldo.

A prática não tem origem oriental, como parece. No ocidente, Hipócrates, o pai da medicina, já utilizava o jejum terapeuticamente, na Grécia. Mas, com o advento da medicina moderna a partir do século 16, a prática do jejum acabou restrita apenas a atos religiosos, para limpeza espiritual, e políticos, como forma de protesto. No oriente, entretanto, onde a medicina e a religiosidade sempre andaram juntas, o jejum alimentar nunca deixou de ser praticado.

Segundo Arnaldo Vilhena, o próprio estilo de alimentação que adotamos faz com que o jejum não seja um sacrifício para o corpo: “Não apenas comemos mal como também comemos em excesso, muito mais do que precisamos. Por isso, quando em jejum, o corpo trabalha com as suas reservas, que são muitas, e de forma alguma será prejudicado pela falta do alimento”, diz ele.

Um tempo para o corpo

Os processos alimentares despendem uma quantidade muito grande da energia que circula em nosso corpo. Depois de uma refeição, por exemplo, cerca de dois terços do sangue se concentram no processo digestivo. Como comemos em excesso e mastigamos pouco, os outros processos orgânicos acabam prejudicados, já que o corpo fica constantemente envolvido com a alimentação. Com o jejum, o organismo consegue o tempo necessário para reequilibrar os seus processos fisiológicos, fazendo com que todos os órgãos sejam igualmente “assistidos”.

Essa necessidade natural do corpo pode ser muito bem observada nas crianças. Quando elas contraem uma doença infecciosa, por exemplo, perdem logo o apetite e só o recuperarão depois que o organismo estiver livre da infecção. Essa recusa do corpo em comer é a forma que ele encontra de concentrar-se na cura da infecção.

Segundo Arnaldo, acostumamo-nos a ver a cura como um processo externo, quando na verdade ela é um processo tão natural quanto respirar. O corpo está constantemente se auto-curando e o jejum permite que essa cura seja mais eficiente, promovendo tempo e espaço para que os mecanismos curativos do corpo atuem onde estão sendo necessários. Por isso, o jejum é terapêutico por si só. “Na verdade, o período de sono é um pequeno jejum. O que se faz é prolongar este período, dando ao organismo mais chances de se curar, de se regenerar”, diz Arnaldo.

O bom jejum

Em geral, quem pratica o jejum terapêutico o faz com regularidade: priva-se dos alimentos por um dia inteiro a cada período de tempo, normalmente um mês. Apesar dos apelos de consumo alimentar, a demanda vem aumentando aos poucos e o jejum vem sendo utilizado até mesmo para emagrecimento. Segundo Arnaldo, a prática é eficaz para combater os hábitos compulsivos de alimentação: “Quanto mais se come, mais se estimula as papilas gustativas e mais se tem vontade de comer. Se esse estímulo é interrompido, a compulsão pela comida acaba ou diminui”.

Há cerca de 30 anos, o jejum foi utilizado como alternativa de emagrecimento e acabou virando moda. Alguns médicos chegavam a internar seus pacientes em hospitais, para que deixassem de comer e assim emagrecessem. Como qualquer método drástico para perder peso, a moda do jejum logo se mostrou ineficaz.

“Quando utilizado de forma rotineira para emagrecimento, o jejum é muito prejudicial e há várias contra-indicações para a prática, como diabetes, problemas renais e de coração”, alerta o endocrinologista Mário Negreiros, professor da Universidade Federal Fluminense e autor do livro Obesidade – mitos e verdades, da editora Cultura Médica. Ele lembra ainda que o jejum sem acompanhamento médico pode levar também à anorexia e não recomenda a prática para crianças e adolescentes.

Segundo Arnaldo, ainda que sem os exageros do passado, muitas pessoas estão descobrindo que é melhor ficar sem comer um dia inteiro do que se privar dos alimentos que gostam em nome da boa forma. Além de desintoxicar o corpo e permitir que os alimentos sejam melhor digeridos, o jejum pode colaborar para o emagrecimento por um outro processo: estudos recentes descobriram que o jejum é capaz de queimar as cetonas, que são gorduras incompletas que normalmente não conseguem ser reabsorvidas pelo organismo e ficam depositadas nas células.

Seja com a finalidade de emagrecimento, cura ou desintoxicação, todo jejum precisa ser orientado por um especialista, principalmente por conta das distorções que a prática possui. O jejum deve começar assim que se acorda e quem jejua pode praticar suas atividades normalmente. Ao contrário do que se imagina, pessoas de saúde normal quando em jejum terapêutico podem trabalhar, se divertir, levar a vida normalmente, já que o corpo possui muitas reservas que podem ser utilizadas nesse período.

É muito importante beber bastante água e, de acordo com a finalidade do jejum, ela pode ser substituída por chás ou sucos de frutas frescos e naturais. Limão, pera e abacaxi são as mais utilizadas, pois são consideradas depurativas. Quanto à fome, Arnaldo afirma que muitas pessoas sequer a sentem. No entanto, deve-se sempre respeitar os limites do corpo e da mente: “Em alguns casos, beber mais água é o suficiente, mas só se deve manter o jejum enquanto ele puder ser feito confortavelmente”, diz Arnaldo.

Outro alerta é em relação aos limites do jejum. Normalmente, 24 horas é suficiente para beneficiar o organismo. Por fim, deve-se comer alimentos leves na noite anterior ao início do jejum e nunca comemorar o término do período num rodízio de pizza, por exemplo. O melhor é voltar ao ritmo alimentar normalmente, para que os benefícios do jejum sejam permanentes. “Se o indivíduo é saudável e pratica o jejum terapeuticamente, para desintoxicar o organismo, certamente irá se beneficiar”, diz o dr. Mário Negreiros.

PUBLICADO ORIGINALMENTE NO SITE PLANETA VIDA – Um informativo que foi descontinuado. Por volta do ano 2000.

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