“Tenho medo de ficar viciada em terapia”

Por Arnaldo V. Carvalho

Volta e meia escuto de algum cliente ou mesmo amigo: “a terapia me faz muito bem, mas estou com medo de ficar dependente dela”. A uma pessoa que muito quero bem, escrevi umas linhas, que publico aqui com acréscimos, por achar que pode ser útil a todos que têm essa dúvida e/ou esse medo.

Esse conceito de dependência e tão relativo!

Para mim, ele é relacionado com a turma das coisas que dão prazer mas não fazem bem e as coisas que não dão prazer e fazem bem. Explico, no mundo tem quatro tipo de ação ou experiência que você pode fazer/viver:

  • As que não fazem bem e não dão prazer (todo mundo quer distância!)
  • As que não fazem bem mas dão prazer (aí mora o perigo, tem um monte de coisa que dá prazer mas não faz bem – e muitas delas viciam).
  • As que fazem bem mas não dão prazer (de remédio ruim, passando por dieta a academia de ginástica, essa é a turma das coisas que não encontra com facilidade uma adesão permanente. Elas até podem fazer bem, mas geram resistência nas pessoas, que precisam sentir prazer no que fazem para aderir legal. Aí é que as pessoas começam e param, começam e param essas coisas, repetidamente!)

E, finalmente…

  • As ações/experiências que fazem bem e dão prazer (tem um monte! Mas as pessoas estão tão condicionadas que já não conseguem aderir de forma concreta, mesmo que seja uma maravilha em todos os sentidos. Exemplo: um casal de amigo chama o leitor para jantar com eles. O jantar foi maravilhoso, comida super saudável, diferente. O leitor chega a pegar a receita dos pratos… Mas ela fica esquecida, e o leitor segue comendo tudo o que comia antes…)

Se uma terapia oferece algum benefício (ex: fazer refletir) mas nenhuma forma de prazer (ex: encontrar respostas), a pessoa desanimará e não ficará. Se, ao inverso, ela oferecer um prazer, mesmo que secundário (ex: alívio ao despejar os problemas em um ambiente neutro, dando-se a sensação de ter “colocado para fora”), mas não faça bem (a terapia bem orientada deve oferecer ferramentas para que a pessoa LIDE e/ou transforme o que foi externado), essa terapia será inconsistente, e a chance da pessoa se ver como uma “viciada” é enorme! Ela sentirá alívio, mas não mudará seus padrões, e assim as fontes de angústia permanecerão em sua vida, estabelecendo um ciclo vicioso.

Esse artigo é sobre a BOA terapia, a terapia bem feita, a que funciona em função da competência do profissional, da vontade do indivíduo e da qualidade de vínculo ou parceria entre terapeuta e cliente.

Aquilo que é bom, dá prazer e faz bem é o que onde vale fazermos brotar a sintonia constante, que é o inverso do vício. É o peixinho q limpa o tubarão, o alimento para  a alma.

Houve um tempo em que grandes pensadores se pensaram vítimas do nós, e desejaram ser “livres” de gente, da sociedade, de Deus, das próprias neuras… Direito legítimo, eles reivindicaram a autonomia do Eu. Mas… A autonomia eremítica é de fato da natureza humana? As vantagens da convivência não criaram aliás, toda uma categoria de animais coletivos, à qual o Homo sapiens encontra-se inserida?

– Xoooô Nietzsche! – Sem pensar esse incrível filósofo desejou ser superultraindependente e ainda chamou isso (esse) de Übermensch (ultra-homem!). Criptonita nele!Mas tudo bem. No contexto sufocante século XIX e suas cristiandades radicais e partidas ele precisava romper. Precisava de seu ultrahomem para sobreviver psiquicamente, tanto quando adesões às suas ideias (todo autor quer ser lido!).

Ultra-independência, ultra-autonomia, quem tem é a ameba, que é unicelular. Só no corpo de uma pessoa habitam mais de 100 TRIlhões de bactérias, sem as quais morreríamos! Dependemos da vida na Terra e do que vem do Espaço para vivermos. Dependemos uns dos outros, e toda essa energia. Se isso pode ser chamado de “Deus”, então ele não tem nenhuma chance de estar morto.

A sintonia constante com o que é bom de fato é sempre não impositiva, sem prejuízo para quaisquer das partes, e aliás, com benefícios para todas elas. É o bom hábito, a coisa que se termina a gente fica com saudades também boas. é o desencontro para o crescer. É o filho que fala para o pai: “chegou a hora de eu seguir pai!”. É o desenlace inesquecível que marcará a vida dos dois para sempre – mas que se compreende com tal força que não há resistências ou desejos de voltar atrás.

Assim também acontece com a boa terapia, onde o profissional atento encontra-se cúmplice do olhar do cliente, que após processo bem sucedido, não importa se mais ou menos longo, saberá despedir-se do setting terapeutico, senão permanentemente, até que surja um outro ciclo de necessidades do corpo, da mente, da alma (indivisíveis).

Somos sociais, sociáveis, precisamos, adoramos e merecemos todo o contato de cuidado, que são e prazerosos num só tempo.

Um tempo para o corpo e o coração – Compreenda o processo terapêutico e o que ele pode fazer por você!

Escrevi o texto abaixo para meus clientes em São Paulo. Mas percebo que pode ser útil a qualquer um que esteja pensando em fazer terapia. Que seja útil. Arnaldo. http://www.arnaldovcarvalho.com

Um tempo para o corpo e o coração
Compreenda o processo terapêutico e o que ele pode fazer por você!

Dar-se um tempo. Observar-se. Redescobrir sua própria força. Aparar arestas. Revisar a base. Torna-la firme. Resolver. Resolver. Resolver.

Quando alguém busca um profissional de saúde, seja para tratar uma dor de cabeça, seja para tratar um coração partido, está buscando tornar-se alguém melhor – nem que seja para que as dores cessem!

Dores no corpo, doenças, emoções, hábitos e atitudes… Cada passo que damos na vida gera conseqüências, e as conseqüências desses passos formam aquilo que somos, em termos de saúde física, mental, emocional. Mas com quem aprendemos nossos passos? Que impressão de mundo tivemos desde os primeiros tempos? Como foi que adquirimos a maneira de caminhar que hoje nos faz estar na exata condição em que estamos, com todas as nossas virtudes, defeitos, prazeres, desprazeres?

Fazer uma terapia é propor ao próprio corpo e mente que se resolva a caminhada. Não é fácil. Haverá dias em que o terapeuta nos chateia. Quase sempre, isso acontece nos dias em que a terapia nos facilita a aproximação com emoções difíceis de serem vividas. Emoções que estariam bem guardadas para que se impeça o sofrimento… Haverá outros em que o corpo se sentirá desorganizado, porque para arrumar as prateleiras de uma estante, as vezes é preciso tirar os livros do lugar.

Porém… Haverá o tempo necessário para se tornar forte e enfrentar aquilo que se escondia dentro de si, caixas de pandora que se não forem abertas, geram das hérnias ao câncer, dos maus sentimentos à uma vida com menos prazer. E pensar que escondemos nossos problemas justamente para evitar o sofrimento e o desprazer!

Quem opta por fazer uma terapia mista, que envolve corpo (não verbo) e mente (verbo), vivencia a possibilidade de atingir estruturas psíquicas que foram constituídas antes mesmo da estruturação verbal, neurolinguística, ao mesmo tempo em que se integra tal fenômeno imediatamente na mente estruturada do hoje.

Essa é a minha proposta para você, e para isso me preparei. Meus estudos em naturopatia, medicinas tradicionais e psicoterapias e terapias corporais diversas aconteceram (e ainda acontecem!) pela noção de que um trabalho mais completo poderá ser realizado se pudermos agir nas diversas facetas humanas, não apenas em uma. O desafio de enfrentar as situações negativas da vida na real origem dos problemas é enorme: poderosas devem ser as ferramentas.

Ainda por isso é que é preciso no mínimo três meses de terapia continuada para que se possam observar os efeitos globais de um tratamento terapêutico. Claro que antes disso muitas dores e dissabores desaparecerão; Porém, tenha a certeza, essa é uma etapa introdutória, básica, inicial do processo terapêutico – o início das obras de uma verdadeira reengenharia do ser.

Estar em processo terapêutico não significa apenas estar presente no momento das sessões. O processo terapêutico é algo que se iniciou quando surgiu, em você, a percepção da necessidade de mudanças e melhoras, e a isto se esboçou uma reação. Dessa feita, o processo terapêutico ocorre 24H por dia; A terapia formal fornecerá ferramentas para que se possa observar o processo e seja possível viver este processo de maneira consciente. Coloca à disposição da cura toda a plasticidade cerebral da qual o ser humano é capaz. As ferramentas que são desde a sessão terapêutica aos exercícios propostos para casa, além de possíveis suplementos, seguem pela semana reforçando as propostas de conscientização, mudança e reequilíbrio efetuadas ao longo da semana.

Finalmente, deixo aqui um pensamento de W. Reich, com o qual concordo e que define como compreendo para que fazemos terapia (sim, eu também me trato, sou gente, quero melhorar-me, e quero sentir plenamente a experiência de estar vivo!):

“Fui acusado de ser um utópico, de querer eliminar o desprazer do mundo e defender apenas o prazer. Contudo, tenho declarado claramente que a educação tradicional torna as pessoas incapazes para o prazer encouraçando-as contra o desprazer. Prazer e alegria de viver são inconcebíveis sem luta, experiências dolorosas e embates desagradáveis  consigo mesmo. A saúde psíquica não se caracteriza pela teoria do nirvana dos iogues e dos budistas, nem pela hedonismo dos epicuristas, nem pela renúncia monástica; caracteriza-se, isso sim, pela alternância entre a luta desprazerosa e a felicidade, o erro e a verdade, o desvio e a correção da rota, a raiva racional e o amor racional; em suma, estar plenamente vivo em todas as situações da vida. A capacidade de suportar o desprazer e a dor sem se tornar amargurado e sem se refugiar na rigidez, anda de mãos dadas com a capacidade de aceitar a felicidade e dar amor.”

Wilhelm Reich (1942) em “Function Of The Orgasm – Vol 1 Of The Discovery Of The Orgone”, Ed. Farrar, Straus and Giroux, 1989