Por Arnaldo V. Carvalho
Vou escrever de memória, sem pesquisa nem revisão.
Me lembro com muita nitidez e carinho do meu primeiro contato com Sergio Cabral. Eu era um jovem sonhador, e no recém-inaugurado shopping de minha cidade, havia um quiosque da rede “Albergue da Juventude” (Hostelling International). Nele, um folder muito simpático falava em tom pessoalista sobre a proposta, então inovadora em se tratando de Brasil, de hostel, hospedagens populares, marcadas pela simplicidade e alta interação entre os seus usuários. Quem assinava o folder era Cabral.
Com o Albergue da Juventude, conheci lugares e pessoas que amo, e durante meu tempo de sócio, recebi algumas cartas do Cabral. Que simpatia, que embaixador da juventude ele parecia ser.
Tempos depois, ele foi para o outro lado da linha da vida. Criou projetos para a terceira idade, igualmente entusiasmantes. Essa era a visibilidade que me chegava sobre o ex-governador.
Só daí a melancolia da queda já me bate.
Juntamos isso com o fato de ser filho de pessoas sempre muito bem quistas pela população (o compositor Sergio Cabral e a pedagoga e museóloga Magaly Cabral), e temos um boa-praça, que teria tudo para ajudar a transformar o Rio em coisa boa. Puxa, que pena Cabral, que pena! Que promessa você foi!
Aí veio a “política pesada”. Sempre envolvido com o PMDB, partido que “levou a melhor” no início da democracia Brasileira pós ditadura, foi ele crescendo, crescendo, crescendo… Virou governador. E apesar dos pesares, de uma certa menor atenção aos mais necessitados, de rumores para lá e para cá, Cabral trouxe umas ideias, e oportunidade para a tal boa transformação não faltou: Beltrame-UPPs, Copa, Rock’n Rio, Olimpíadas… Cabral teve participação em muita ideia boa… Não completou nenhuma, não brigou para que nenhuma fosse bem implantada (bem implantada, isto é, com seus impactos aproveitados para o que realmente é importante – e sobre isso escreverei amanhã, prometo).
Fico reprisando a história que vivi, e sem pesquisar, me pergunto: em que ponto ele “se foi”? Quando se perdeu? Quando deixou de ser apenas um convicto na iniciativa privada, na melhoria da zona sul, e passou a desviar dinheiro, a entrar em esquemas? Dizem que seu sogro é o grande monopolista do transporte de massa no Rio. Não vou conferir isso agora. Dizem muitos dizeres, e parte de tudo pode ser verdade ou não. Meu texto não é sobre isso. É sobre o fim da dignidade e como todo fim de dignidade me entristece.
Agora, lá está ele, em uma cela, humilhado, removido de sua condição plena de humano, pai, marido, filho. E o velho alberguista, triste como um filho que descobre da pior maneira que seu pai vale pouco. Só que sem surpresas… Estou velho demais para isso, e alienado de menos para tanto. Lá está Sergio Cabral Filho, saindo do mundo de ilusões de relógios e iates de bilionários, e entrando na cadeia-realidade.
Podia ter entrado para a história como um grande homem. Agora, possivelmente será só mais um no chafurdar da lama do Rio de Janeiro político atual.
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Arnaldo V. Carvalho é cidadão do Rio de Janeiro.
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