Sol de Primavera

Quando entrar setembro

E a boa nova andar nos campos

Quero ver brotar o perdão

Onde a gente plantou juntos outra vez

Já sonhamos juntos

Semeando as canções no vento

Quero ver crescer nossa voz

No que falta sonhar

Já choramos muito

Muitos se perderam no caminho

Mesmo assim, não custa inventar

Uma nova canção que venha nos trazer

Sol de primaveraAbre as janelas do meu peito

A lição sabemos de corSó nos resta aprenderJá choramos muito

Muitos se perderam no caminho

Mesmo assim, não custa inventarUma nova canção que venha trazerSol de primaveraAbre as janelas do meu peito

A lição sabemos de cor

Só nos resta aprender

Fonte: Musixmatch

Patrícia Bastos e Dante Ozzetti + Luedji Luna

Fazia tempo que não me impressionavam as vozes novas da MPB. Mas assistam esta cantora amapaense com quem “esbarrei” na Internet:

Seu parceiro é Dante Ozzetti, um violonista e arranjador premiadíssimo. Não para menos. At last but not least, deixo um vídeo impactante em que ela e Ledji Luna tocam juntas e se apresentam, em um quilombo no Amapá (Curiaú) pelo festival Mana 2021. Que coisa linda.

Rita von Hunty

O Prof. Guilherme Terreri, conhecido por sua personagem drag Rita Von Hunty, é uma das pessoas mais inteligentes e interessantes que eu conheço. Ele mandou essa mensagem às portas do segundo turno, mas eu a considero ainda totalmente válida.

Aproveito para adicionar um vídeo de cinco minutos da Von Hunty. Esse já é velho mas se você não viu, veja.

Porque não faço L mas voto 13 no dia 30

Porque “não faço L mas voto 13” no dia 30.

(Por Arnaldo V. Carvalho*)

Não será um textão. Quem já me acompanha vai ler agora, em um parágrafo curto, uma síntese de tudo o que repito há anos:

Nunca votei e sempre fui um crítico aos governos de Lula (2003-2011), e definitivamente não sou um “lulista”. Mas divergir de um projeto nacional é muito diferente de protestar contra a ausência de um projeto, ou de não admitir a presença de um projeto fascista de estado (ou com características fascistas). Por essa razão (e outras), em 2022 meu voto é 13.


Quem tiver paciência, pode ler uma “expansão” dessa ideia e conhecer minimamente a minha condição e posição política. Estou colocando isso aqui porque é primeira vez que eu declaro meu voto publicamente – a despeito de ter me esforçado, nas últimas eleições, para ajudar quem me lê na direção de um voto consciente sem oferecer qualquer endereço a quem votar.

Histórico (d)e algumas convicções políticas

  1. Meu histórico de votos em Lula: Nunca havia votado, e sempre fui um crítico aos governos de Lula (2003-2011). Minha crítica não começou quando veio a onda de escândalos de corrupção (cujas reais conexão para o o então presidente nunca foram bem esclarecidas). Ela é mais antiga, simplesmente porque discordo das direções que ele considera as melhores para o país. Essa crítica não me faz negar os progressos sociais evidentes de sua gestão (bem como os progressos não me fazem ignorar a manutenção da concentração de renda).
  2. Meu histórico como (NÃO) militante por pessoas ou partidos: Aliás, podem buscar e não verão eu fazer propaganda ou defender político específico nenhum ou partido específico nenhum. Nem sou muito de declarar voto. Mas é claro que estou sempre observando as posturas e atitudes coletivas dos partidos e seus representantes, e as estatísticas mostram que, no geral, alguns partidos e suas pessoas propõem e votam em pautas com as quais identifico serem melhores para as pessoas do que outros.
  3. Se sou “de esquerda” ou de “direita”: É comum que amigos e conhecidos “de esquerda” me achem “à direita” e os de direita, que sou “de esquerda”. Eu não me reconheço como parte dessas posições, porque a coluna de valores que são colocadas como identitárias (ou seja, o que faz alguém sentir pertencimento em relação à “esquerda” ou “direita”) são, no mais essencial, as mesmas (talvez por desconhecimento da maior parte das pessoas acerca da origem dessas palavras e como se construíram sistemas de valores associados a uma ou a outra). Eu quero paz, segurança, educação, respeito, honestidade, amor, quero ter voz e ser escutado, e quero isso para TODAS as pessoas e para a natureza. Isso é ser o quê? Esquerda ou direita?
  4. Capitalismo ou socialismo: é tão simplista dividir o mundo e os diferentes sistemas econômicos desse jeito! Então vou ser simplista também na minha posição, afirmando aqui por escrito o que sempre digo aos amigos quando me perguntam: em uma sociedade ética, qualquer sistema serve, porque sempre se criará mecanismos de justiça social e equilíbrio econômico, e todos terão seus espaços e dignidade garantidas.
  5. Quando voto não penso apenas em mim ou minha realidade: combato o que para mim é um falha na consciência política de muita gente. Há quem se candidate, e há quem vote, dirigindo-se a pautas que apenas a eles interessa. Surge o “Fulano do bairro”, o “Ciclano do SUS”, a beltrana da “igreja”. Que pese seja legítimo a qualquer cidadão – inclusive os que se fazem candidatos – se sentirem mais envolvidos com/por certas causas e menos por outras, ainda assim, há que se fazer um esforço de olhar o todo. Se não dirigirmos nosso poder de voto com esse fim, mesmo sem querer fomentamos desigualdades, porque se todos pensam em suas pautas “e fim”, as minorias seguirão sendo esmagadas e estaremos condenados a viver sempre em flerte com fundamentalismos, totalitarismo e intolerância. Por isso sim, especialmente nas esferas executivas federais, sou mais a favor quanto mais um candidato tenha um pensamento integrador, onde todos possam ter voz.
  6. Tamanho da economia desconsiderando concentração de renda é uma das maiores balelas utilizadas no Brasil: aqui não salvo ninguém. Há uma clara disputa de narrativas sobre crescimento econômico, tamanho do PIB etc. O silêncio por trás é termos a segunda concentração de renda mais violenta do planeta (perdemos apenas para o Qatar). Ou seja, a posição no ranking econômico, o tamanho do crescimento etc., não muda de fato a realidade de 99% das pessoas caso a concentração permaneça aumentando. É a conta mais fácil do mundo de fazer. Eu tenho 90 pedacinhos de qualquer coisa, outra pessoa tem 9 e outras 98 tem que dividir um pedacinho. Entrou mais 100 pedacinhos. Se mantemos a concentração (pior é se aumentasse), quantos pedacinhos a mais eu (dos 99 pedacinhos) vou ter, o sujeito dos 9 pedacinhos terá, e os outros 98 terão? Há quem acredite que “mesmo assim, os 98 que dividem um único pedacinho aumentarão em 100% seu ganho, tinham 1 pedacinho agora tem 2”. É um discurso real, há quem de fato defenda isso! Como há quem (e aí acho que é a maioria) acha incrível discutir tamanho da economia ou crescimento econômico… Precisamos é de desenvolvimento, que leve a uma mudança desse quadro que para mim é simplesmente perverso.
  7. Diferença entre divergir e não admitir: Divergir de um projeto nacional é muito diferente de protestar contra a ausência de um projeto, ou de não admitir a presença de um projeto fascista de estado (ou com características fascistas).

O 7×1 de Lula sobre B ou Critérios de análise que usei para essas eleições em particular

  1. Utilização de fontes oficiais: há tempos eu só aceito como informação analisável a imprensa oficial (com todos os seus problemas, ela ainda é a mais fiscalizada, e composta de maior número de jornalistas formados), e dados emitidos por instituições reconhecidas. Eu sempre comparo as fontes de informação, inclusive com uso de fontes internacionais. E uso também iniciativas oficiais de fact-checking. Opiniões pessoais, canais do Youtube, etc. são ignoradas, à exceção da proveniente de autoridade reconhecida: por exemplo, um doutor em economia que dá aulas em uma instituição pública possivelmente terá uma análise dele ouvida por mim (mas eu vou checar quem é). O influenciador digital “da hora” não tem qualquer chance comigo. É muito difícil para alguém que utiliza estritamente este tipo de fonte não enxergar vantagens de se votar em L em relação a B.
  2. Comparação de administrações federais entre os candidatos: É estranho, pois estamos votando não em propostas de governo, mas em dois modelos pré-experimentados. Independente da amoralidade e do discurso do ódio do presidente atual e de seu grupo, sua administração foi ruim nas mais diversas áreas, e qualquer comparação estatística é capaz de mostrar que entre esses dois governos (o de Lula entre 2003-2011 e o de B. 2018-2022), o primeiro foi muito, mas muito melhor para a grande maioria da população. Sem detalhar todas as comparações, apenas focando no perfil técnico dos ministros para pastas de alta importância como saúde, educação e meio ambiente, vê-se que em Lula havia gente com total relação com as áreas para quais ocuparam os cargos. Já no caso do governo B as indicações eram totalmente políticas. Esse é só um pequeno detalhe no todo de problemas administrativos que começam na incompetência e terminam em vilanice, em vários casos.
  3. Comparação do histórico na política nacional: B ficou 28 anos como deputado pelo Rio de Janeiro, tudo o que sei que ele votou na Câmara dos Deputados, votou diferente de mim, tudo o que discursou eu discordei, e ele no final das contas não conseguiu apresentar mais do que dois projetos de lei nessas quase três décadas? Para mim isso já é eliminatório. Para não falar de “como tudo começou”. Mas será que a trajetória de L é passível de eliminação? Não. Ele liderou o movimento operário durante a ditadura, ajudou a formar um dos mais importantes partidos brasileiros, foi ativo nas Diretas Já, como deputado federal (mais votado da história até então), participou ativamente da Constituinte e levou para a câmara cinco projetos relacionados a reposição salarial (em apenas quatro anos de mandato). No mínimo sua coerente trajetória demonstra liderança, proatividade e merece respeito.
  4. Sobre a corrupção versus decisão de voto: Em relação à corrupções (no plural), vejo que o brasileiro pode escolher três formas de julgar os políticos, e os dois primeiros são: “todos são corruptos” (e se assim for o critério de voto nem pode ser esse); “apenas um lado é corrupto” (essa é uma tomada de posição que desqualifica a possibilidade de um voto consciente, já que há evidências de corrupção de grande escala em diversos governos). Uma terceira possibilidade, que é a que sigo, é de não me considerar dono da verdade, nem um especialista em direito (eu não sou), e ir atrás das acusações, processos e resultados e suas pessoas. Não havendo competência para avaliar as nuances do juridiquês (também meu caso), ao menos ir ler o que dizem os especialistas, juristas profissionais, etc., buscando preferencialmente mais de um posicionamento. Se você fizer isso em relação aos diversos casos de corrupção e improbidades administrativas, pensará duas vezes entre simplesmente taxar Lula de ladrão e chamar B. de “mito”. Aliás, poderá desconstruir e reconstruir grande parte das imagens idealizadas de heróis e vilões por trás das figuras políticas.
  5. Olhe para o campo: Há anos recomendo que compreender a política nacional é olhar para o campo. E infelizmente, em meu pequeno círculo de amizades, poucos olham. Quando eu digo isso, estou sim falando de meio ambiente e ecologia, mas não simplesmente. O ponto é que o campo (e as florestas) detém a maior concentração de poder no Brasil. O campo tem forte mentalidade armamentista, do plantation a base de agrotóxico, da boiada que passa e destrói, das relações estéticas com um modo de vida hiperhierarquizado e que não respeita vidas e suas diferenças. O campo não consegue entender a importância de transitarmos para uma sociedade mais industrializada com tecnologia própria, e por isso não oferece os devidos incentivos às ciências. É o campo quem elege boa parte dos poderosos que acreditam em um projeto de nação de “discurso único”. É o campo quem faz boa parte do dinheiro do país, e ao mesmo tempo concentra cada vez mais renda. É por isso que todos os candidatos no primeiro turno flertaram com o agro. Quando olho para os detalhes no modo de lidar com os poderosos do campo, no entanto, vejo diferenças significativas entre os dois governos. Há uma tentativa clara em Lula de se negociar espaços vivíveis para uma população “não poderosa”, e a contrapartida é uma política externa que sempre foi muito favorável aos mega empresários. B. nunca se interessou por qualquer tipo de negociação nesse sentido. sequer.
  6. Discurso de ódio, apologia à ditadura, misoginia, etc. e tentativas de legitimar tais discursos e práticas: Isso nunca saiu da boca do Lula e está no plano do inconcebível em relação a qualquer candidato à qualquer posição pública onde eu tenha o direito de opinar através de meu voto.
  7. Mentiras e redes de fake news: estudos e investigações jornalísticas, acadêmicas e de instituições de proteção à transparência, lisura das eleições (incluindo o TSE), dentre outras mostram o quanto Bolsonaro é incomparavelmente o maior mentiroso da história, e o quanto a rede que seu grupo montou em torno de fake news construindo uma “realidade paralela” difícil de descontruir uma vez que a pessoa tenha entrado nela. Outro critério desclassificatório contra B, e ainda mais perverso, pois enreda pessoas em uma rede de distorção de fatos, reversão de valores e manipulação extrema. É quase inacreditável que não hajam leis nacionais e internacionais que prevejam um combate mais inteligente e incisivo à tais práticas. Nesse sentido, também não dá para comparar a qualidade de falas dos dois candidatos nem a diretiva central das duas candidaturas e suas estratégias nas redes. (Repito: a quem está me lendo nesse momento e acha que sou eu o iludido, me procure em particular e vamos trocar fontes de informação e analisar friamente os discursos. não dá para ter preguiça de ler ou estudar em decisões que afetam nossas vidas)
  8. O fato de eu ter várias discordâncias e cobranças em relação a Lula (e parte de seu grupo), seus governos e atitudes relacionadas à própria candidatura: A história é longa, e nesse momento em que declaro voto a ele, já digo que vou dele cobrar tudo o relacionado às minhas históricas críticas ao governo Lula 2003-2011. Também fique claro que sim, coloco na conta dele, seu grupo e estratégias eleitorais uma série de pontos (outra longa história que sim vou expor em algum momento minha visão). Mas vale frisar que este “voto contra” não tem origem de qualquer mérito da parte do outro candidato (que se eu for expor o mesmo nível de discordância “fora tudo” o que já mencionei, de novo perde pro Lula, e aí é “8×0”. Em outras palavras, no 7×1 dessas eleições o “x1” é também um gol (esse contra) de Lula.

* Arnaldo V. Carvalho, eleitor, escritor, terapeuta e professor em saúde natural, pedagogo, mestre e doutorando em educação.

Políticos e partidos manipulam informação sobre gasto público com educação. Por quê?

Pequeno artigo meu, onde pondero sobre afirmativas incompletas, equivocadas e/ou desinformadas (desinformantes) sobre educação no Brasil. Publicado originalmente no Aprendiz de Professor. (Arnaldo)

Aprendiz De Professor

Além de Bolsonaro que mal assumiu a presidência em 2019 e já disse que o “Brasil gasta excessivamente com educação”, partidos políticos como o Novo também ficam no raso e partem de perspectivas senso comum de quem não entende de educação, políticas públicas, diversidade, dentre outros.

Políticos e partidos manipulam informação sobre gasto público com educação. Por quê?

Por Arnaldo V. Carvalho*

É verdade, o Brasil gasta um dinheirão em termos absolutos. E é preciso concordar: podemos e devemos ser mais eficientes (não só com educação). Mas o buraco é muito mais embaixo do que aquilo que parte da classe política aponta tanto como problema como para suas “soluções”.

Vejam por exemplo os argumentos do Novo em relação ao problema da educação brasileira e o apontar de suas soluções:

Na América do Sul, o Brasil é o país que mais gasta com educação. Mesmo assim, fomos o…

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Como pode?

Frase atribuída ao escritor José Saramago*.

Certa vez me perguntaram: “Como podem homens sem Deus serem bons?”. Respondi: “Como podem homens com Deus serem tão maus”.

(atribuído ao escritor português José Saramago – 1922-2010).

(*) Não consegui localizar a fonte, apenas indicações supostas mas que não se confirmaram.

“Acredito que ter um caminho espiritual não nos isenta de nossa responsabilidade humana”.

Não conheço ninguém desse grupo, quem foi o proponente ou o autor do texto da leitura coletiva feita no vídeo. Mas gostei muito do posicionamento por parte daqueles que buscam se tornarem pessoas melhores a cada dia e tem pelo visto o Amor e o conhecimento como chave principal em suas práticas, técnicas e saberes. Corajosamente, o grupo saúda a ciência, protesta contra o negacionismo, acolhe a censura psicológica daqueles que estão calados (inclusive) porque temem os julgamentos e chamam para a realidade, para a ruptura do silêncio e um re-posicionamento no mundo frente a todo o desrespeito a ocorrer no cenário político atual.

É muito importante que esse “mundo nova era”, ou “zen”, “bichogrilo” etc. abandone a característica “isentona”, como se fosse coerente simplesmente fingir o que não está acontecendo, como se fosse bacana criar uma “bolhinha paradisíaca” e lá ficar, enquanto a Vida está sendo implacavelmente atacada.

Afirmar responsabilidade humana foi um ato para lá pé no chão! Estou com eles! Me representam!

Minha gratidão aos autores e participantes do vídeo – torço que algum deles se comunique para eu poder colocar os devidos créditos aqui no blog!

Um jeito de definir o voto

O ambientalista e professor Carlos Eduardo Aguayo Reis, a quem tenho a honra de chamar de amigo, há anos milita por uma maior consciência na hora do voto. Ele criou uma cartilha neutra, que ajuda o eleitor a pesar suas convicções entre os candidatos, ajudando no processo decisório.

Estou disponibilizando aqui os dois materiais do Carlos para todos os que queiram votar sem pesos de consciência. (Valeu Cadu!). Para quem já se posicionou de modo firme, é inútil. Mas pode ser bem útil para quem não acompanha política e quer votar certo – no ponto de vista de votarem em candidato que de fato se alinhe às próprias ideias, ao que acredita, ou para aquele que quer revisar e ter mais certeza de quem merece seu voto. Mais democrático impossível.

OBS: A cartilha não exime o eleitor de pesquisar, pelo contrário, ela traz questões e cria um sistema de peso daquilo que o próprio eleitor considera prioritário. Pode dar algum trabalho, mas ela não é chata de fazer. É excelente!

Cartilha Eleições Presidenciais 2022

Cartilha do Eleitor Consciente – como funciona

Elas brilham, brilham muito!

Musical impossível de se ver na Broadway ou em qualquer outro teatro do mundo homenageia mulheres, inspira, expõe questões sociais e encanta plateias

Por Arnaldo V. Carvalho

Esta é uma resenha de

Semana passada uma conhecida comentou ter ido a um musical em Copa: “Elas brilham, já ouviu falar? É sobre mulheres”. Ela, que já havia assistido a grandes espetáculos no Rio, em Nova York e países da Europa, estava impressionada. “Qualidade Broadway?”, eu provoquei, e ela me disse um sim tímido, como quem quer expressar: “tão bom quanto, mas muito diferente”.

É essa a essência de “Elas Brilham”, Musical que também fui assistir, e conseguiu a façanha de me emocionar do primeiro ao último número.

Uma resenha profissional e maravilhosa (bem melhor que a minha), escrita por Andréia Bueno, está aqui: https://acessocultural.com.br/2022/08/doc-musical-elas-brilham-realiza-curta-temporada-no-rio-de-janeiro/. Caso prefira, me ler é só continuar!

Para quem já havia assistido a 60! Década de Arromba, 70? Década do Divino Maravilhoso, sabe que essa é a terceira criação do gênero Doc. Musical assinada por Frederico Reder e Marcos Neuer – uma proposta original e diferente de espetáculo, cheio de lirismo mas com uma narrativa que aproxima os expectadores de recortes da história bastante relevantes do país. E sem dúvidas, esse novo espetáculo demonstra que a dupla chegou ao seu auge de maturidade no que tange ao Doc. Musical, e quanto a isso aponto aqui algumas observações:

  • A primeira marca disso é que foi possível sentir a obra como fruto da coletividade, uma coletividade quase 100% feminina. Quase toda a orquestra e todo o elenco, inclusive, é composto por mulheres. Afinal, como encenar sobre mulheres históricas sem a escuta e participação direta de mulheres? Até por isso, vou me referir aos méritos da peça como simplesmente “a peça” ou “o musical”, e não apenas aos seus criadores.
  • A segunda marca é a ousadia extrema. Desapegaram-se de algumas referências típicas dos grandes musicais, como elencos enormes, coreografias hipercomplexas e atrizes e atores exibindo corpos de beleza normotípica. Ao invés disso, concentraram-se em qualidade e diversidade. Escolhidas a dedo, foram arrebatadas estrelas da música e do canto: Sabrina Korgut, Ivanna Domenyco, Diva Menner, Jullie, Thalita Pertuzatti, Débora Pinheiro e Ludmillah Anjos. Sete incríveis mulheres, brancas e pretas, mais novas e mais velhas, mais magras e mais gordas, descobertas por si mesmas mulheres em diferentes momentos de vida… Todas maravilhosas e impecáveis. Uma elite de voz e emoção.
  • A terceira é a marca da autenticidade: as atrizes, que se revezam dando corpo e voz a história das mulheres através dos séculos, do Brasil, da música, também tem seu momento de narrarem-se. É um dos mais emocionantes números, sem dança, em “cru” de voz falada e cantada, onde a plateia descobre que não se tratam de entidades místicas descidas à terra apenas para entreter os mortais. Ali por trás da magia, há mulheres, mulheres com suas histórias e dores, e que se estão ali foi por uma construção de muita luta, dedicação e superação.

Do ponto de vista artístico e crítico, as brasileiras que marcaram da história da música às conquistas sociais do gênero, no país, seriam mais do que suficientes para compor uma narrativa de peso (se houve quem tivesse acusado os musicais sobre os anos 60 e 70 como “chapa branca”, Elas Brilham não deixa dúvidas do posicionamento artístico acerca das realidades violentas que vivemos). Mas para um público de ouvido e lentes acostumadas com as americanidades, talvez tenha sido inevitável que a peça oferecesse momentos destacando personalidades e cantoras estadunidenses, entremeadas a momentos que marcaram a história da Mulher naquele país e mundo a fora.

É assim, em harmonia entre mulheres de lá e de cá e de outras partes, que no palco e em telas auxiliares (o espetáculo não economiza em recursos audiovisuais), somos trazidos à música e à causa da mulher. Deparamo-nos com Rosa Parks, Elza Soares, Aretha Franklin e Ella Fitzgerald, Annie Lennox, Marielle Franco, Tina Turner e Janis Joplin, Elis Regina, Elba Ramalho, Dercy Gonçalves, Alcione e Madonna… dentre muitas outras!

Aliás, é digno de nota a qualidade e originalidade com que as combinações e fractais musicais vão surgindo sempre com força, em uma variedade de gêneros incomum. A atmosfera é de valorização da mulher em sua diversidade, o que passa pelo reconhecimento de uma sociedade machista e seus problemas, pela indignação que brota mesmo nos espíritos engajados com esta que talvez seja nos tempos atuais a principal causa a ser enfrentada pela humanidade. Mas, como parte do Girl Power em seu melhor aspecto, tudo é feito com muita força e muita beleza. De cabeça, posso lembrar das lindas composições música/interpretação/luz/figurino e trazer ao leitor que a peça passa por samba, MPB, rock, disco, pop, axé e mesmo o chamado “feminejo”, que mesmo para quem não gosta (como eu), entra ali com uma pertinência mais que cabível…

Não dá para terminar sem dizer que não, essa peça jamais poderia ter sido criada na ou para a Broadway. Nada se viu de parecido, nem lá nem aqui. Não tenho dúvida, porém, que por onde passar, Elas Brilham terá como resultado o arrebatamento das plateias de qualquer canto. Assim como Carmen Miranda encantou os americanos no início do século XX, agora é esse coletivo o que parece ser a contribuição mais genial do teatro musical nos últimos tempos.

Você pode saber sobre muitas das escolhas musicais, das mulheres enaltecidas e dos vínculos entre a música e o fortalecimento de uma sociedade melhor para todos no PDF oficial da peça: https://drive.google.com/file/d/1vhgmZtbcijI9r6V2c0gy0qGsodKH-jlO/view

Esse será o último final de semana de Elas Brilham no Rio de Janeiro. Mas soube que a peça estará em diversas capitais do país. Fiquem de olho, preparem-se, NÃO PERCAM. Vale cada centavo. Vai para a Vida.

Site oficial da peça: https://www.elasbrilham.com.br/

A peça Elas Brilham e minha conhecida do início do texto: um curto relato de empoderamento feminino

A minha conhecida, cuja trajetória conheço bem, já passou por muitos ciclos em sua terapia. Anos atrás, começou a se tratar de sintomas difusos como ansiedade e desconfortos pelo corpo…. Na época, ela quase não associava o que vivia com uma antiga má relação afetiva. Viveu por muitos anos com um homem que de amor e respeito pouco ofereceu. Viúva, trabalhou na terapia a importância de encontrar valor em si mesma. Recentemente, deu-se conta, experimentando uma nova relação, que da velha restara um certo preferir estar “mal acompanhada do que só”. Não durou: mais forte, mais ela, minha conhecida experimentou, pela primeira vez em seus 62 anos de vida, estar só como preferência a estar mal acompanhada. Semana passada, me contou que está de paquera nova. Mas já adiantou que a recusa a ir com ela em Elas Brilham (ela contou para ele que veria de novo para lhe fazer companhia, já que a peça era excelente e tinha certeza de que valeria a pena para ele) era um sinal de alerta. Não, ela decidiu que brilha e homem nenhum lhe tirará isso mais. Agora vejam só: criativamente, Elas Brilham tornou-se para ela, um teste anti-machista de primeira qualidade. Genial.